quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Amor X Violência - À LUZ DAS ESCRITURAS.



Paul Petersen
Secretário de Campo da Divisão Sul do Pacífico
Em minha terra natal, Groenlândia, a maior ilha do planeta, os homens costumam perguntar uns para os outros, em tom de brincadeira: “Você já parou de bater na sua mulher?” Não há uma resposta correta para essa pergunta; quer seja “Sim” ou “Não”, você terá problemas. Lembro-me de quando era menino que não era nada divertido quando nos diziam para não bater nas meninas. No entanto, elas podiam nos arranhar ou mesmo morder, e eu era um pobre menino indefeso.
Posteriormente, recebi notícias estranhas de Nuuk, capital da Groenlândia, onde um de meus amigos estava trabalhando. Depois de várias divergências no lar, a esposa acabou atacando violentamente o marido. Imagine, as mulheres batendo nos homens!
Infelizmente a realidade não é uma piada. A violência e o abuso no lar são algo terrível. Onde uma vez dominava o amor, hoje impera o temor. No início do relacionamento, estavam atraídos um ao outro por sentimentos de grande afeição; agora, o homem e a mulher estão emocionalmente enredados em uma história comum de violência, retribuição e tentativas cada vez mais fúteis de reconciliação. As crianças crescem em meio a essa violência como o modelo predominante de resposta para todas as situações de crise.
Faz parte de minha natureza, como ser humano egoísta, tentar justificar meus atos depois do fato. Várias culturas podem usar o que se entende por desculpa aceitável para um comportamento anormal. Faz parte da natureza de qualquer pessoa religiosa na cultura cristã tentar desculpar seus atos egoístas apelando para a Bíblia, a autoridade aceita. Por esta razão, as pessoas, às vezes, justificam o abuso e a violência usando os textos bíblicos. “Minha esposa deve submeter-se”, reivindica o marido, referindo-se a Efésios 5:22. Assim, a falta de submissão indica que eu, como homem, devo educar, ensinar e mesmo corrigir minha dócil esposa? Colocá-la no devido lugar? E deixamos de observar o que está na Bíblia, de capa a capa, pelo fato de que “o homem é o cabeça”? No entanto, considere as leis divinas dadas a Moisés.
A Bíblia trata da questão da violência e do abuso no lar? Em alguma parte dos escritos sagrados está implícito se o marido ou a mulher pode ou não agredir o cônjuge? A verdade é que nem o Antigo nem o Novo Testamentos silenciam sobre esta questão. Os ensinos apresentados no texto sagrado são coerentes e consistentes.
Cultura e Leis do Velho Testamento
Não há dúvida de que as culturas nas quais a Bíblia foi produzida eram dominadas por homens e que as mulheres tinham muito poucos direitos legais, se é que podiam fazer uso deles e, com muita freqüência, sofriam abuso. Mas devemos esclarecer um ponto: o fato histórico não é uma necessidade ética; a descrição histórica não implica em prescrição divina.
As leis divinas partilhadas por Moisés, de muitas formas, atendiam aos grupos mais fracos na sociedade, tentando proteger a viúva, o órfão e o pobre contra as conseqüências de tantas maldades que já eram praticadas. Deus nunca desculpou a escravidão e, por reconhecer a sua existência, deu leis que garantiam alguma proteção contra um abuso maior (assim como vemos em Êxodo 21:7-11 e Deuteronômio 21:10-24).
No ideal de Deus não deveria, jamais, existir o divórcio, mas quando os homens repudiavam, isto é, mandavam embora a esposa, Deus buscou proteger as mulheres contra o abuso extremo e assegurar-lhes o direito de se casarem novamente e de estarem socialmente seguras, ao prover leis de certificado de divórcio (Deuteronômio 24:1-4). Comparando-se com todas as leis conhecidas nas culturas do Antigo Oriente, esta lei era única em sua tentativa de proteger as mulheres. Deus reconhecia a realidade e falou a uma determinada cultura para estabelecer as melhores leis possíveis sob tais circunstâncias.
Destacamos ainda que é necessário estarmos cientes do fato de que as leis do Antigo Testamento eram leis usuais. A maioria delas era transmitida de forma oral. As leis escritas eram exemplos únicos em conflito com a tradição ou eram referentes a casos extremos que serviam como exemplo para situações similares menos extremas.
Este antecedente ajuda-nos a entender o escopo e as conseqüências de algumas leis que de outra forma não seriam tão bem compreendidas. Por exemplo, se um homem ferisse seu escravo, homem ou mulher, por tê-lo espancado, esse escravo deveria ser libertado (Êxodo 21:26-27). Esta era uma situação extrema. O escravo pertencia, socialmente, à classe mais inferior na casa. Conseqüentemente, os judeus compreendiam que a lei implicava em que o homem, certamente, também não devia bater na esposa. Ou ainda, considere a lei descrita em Êxodo 21:8-11. Ela protege a esposa da escrava, pois naqueles tempos esta poderia acabar sendo a segunda esposa na casa. Exigia-se que o homem lhe fornecesse três elementos básicos: alimento, vestuário e direitos conjugais / alegria nupcial.
Na cultura judaica, essa lei torna-se parte do fundamento para as decisões referentes ao casamento. Nos dias de Jesus, todas as cortes rabínicas concordavam que o homem era obrigado a cumprir esses três elementos básicos para com sua esposa. Por lei, a mulher não tinha permissão para pedir o divórcio (esta era prerrogativa do homem), no entanto, se o homem não suprisse essas necessidades, ela poderia procurar os juízes que iriam ordenar que o marido assumisse essa responsabilidade, pois, do contrário, seria multado. As multas eram tais que o obrigavam a tratar a esposa com decência ou divorciar-se dela a fim de que estivesse livre para se casar novamente.
Lei e Cultura no Novo Testamento
Jesus nunca tratou especificamente das leis referentes ao divórcio, mas pediram-Lhe para tomar posição quanto uma outra batalha legal travada entre as diversas escolas rabínicas de Seus dias. Ele tomou posição (cf. Mateus 19:3-10) de que o homem não tinha permissão para se separar de sua esposa por qualquer motivo, além da quebra do mandamento. Além disso, ele enfatizou o ideal original proposto para o homem. Nunca foi propósito de Deus que o casamento fracassasse. No entanto, este é um fato que ocorre, “por causa da dureza” do coração, não temos como negar.
Alguma vez Jesus falou sobre como viver um com o outro, de tal forma que o casamento sobrevivesse aos desafios da vida? Certamente que sim. A declaração feita por Jesus de ”amar de amar os inimigos” provê o fundamento. Este é outro exemplo de um caso extremo. Se devemos oferecer a outra face (Mateus 5:39), certamente está implícito que não devemos bater na esposa, a pessoa da nossa maior intimidade. Com isso, Jesus não está requerendo que você bata duas vezes no rosto de sua esposa; antes, ordena que você não use de violência. A vida conjugal, com amor mútuo, irá manter o casamento intacto.
Considere agora o fruto do Espírito descrito por Paulo, em Gálatas 5:22 e 23. Ele consiste de amor, alegria, paz e também de bondade, amabilidade e de domínio próprio. Bater em minha esposa, de maneira nenhuma pode ser compatível contra estes valores.
Que ninguém se engane! A Bíblia, em parte alguma, justifica o abuso e a violência contra outra pessoa, nem mesmo contra um inimigo e muito menos com aqueles que são mais achegados a nós. Não devemos abusar da Bíblia dessa forma!
O problema da violência no lar é uma trágica realidade. Necessitamos reconhecer o abuso e a violência em todas as suas faces, por aquilo que são, e evitar qualquer tentativa de usar a Bíblia para justificar o mal. Deus deseja ajudar todos aqueles que de alguma forma estejam enredados em tais situações. Não é Seu desejo que o amor venha a morrer e que os casamentos cheguem ao fim. Muitos bons conselheiros cristãos recebem instrução para ajudar os casais vitimados por essa situação. O que a Bíblia ensina sobre esse tema é claro e patente!

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